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terça-feira, 31 de janeiro de 2012

O réu previdenciário


Antônio Rodrigues de Lemos Augusto é advogado do escritório Abreu Advogados, em Cuiabá-MT. E-mail: lemosaugusto@uol.com.br

Quem conhece clientes do INSS, principalmente pessoas inválidas ou idosas, já escutou: “Há peritos do INSS que destratam os pacientes” ou “Há peritos do INSS que não deixam os pacientes entrar no consultório acompanhados de um familiar, um direito garantido”...

Há muitos peritos do INSS cujos laudos são revertidos na Justiça, justamente porque não reproduziram a verdade em relação às pessoas atendidas. Ou há incapacidade técnica na elaboração desses laudos ou há alguma orientação do governo federal para dificultar a concessão de benefícios, passando por cima da veracidade e da ética.

Lembro-me de uma reportagem do Fantástico, em 2007, que apresentou o sistema previdenciário brasileiro como um dos melhores do mundo. Toda a matéria foi feita com base em um estudo do próprio governo federal. Todas as pessoas ouvidas defendiam a tese da reforma da previdência em detrimento dos benefícios hoje existentes. Em momento algum a reportagem ouviu um representante sequer de idosos, de aposentados, de beneficiários, da oposição. Um cidadão deu entrevista dizendo que os benefícios favorecem mais a classe média, por isso devem ser enxugados. Não conhece o que é ser beneficiário de auxílio doença no Brasil.

Tem o caso verídico, em Cuiabá, do portador de deficiência mental desde quando nasceu. Recebia o benefício “pensão por morte”, em virtude do falecimento da mãe no parto. Em regra, esse benefício é cessado quando o cidadão completa 21 anos, salvo se justamente possuir deficiência física ou mental que o incapacite para a vida própria. E o INSS cortou o benefício... O perito não conseguiu diagnosticar a doença mental anterior aos 21 anos. Escreveu que a doença mental começou imediatamente após o cidadão completar 21 anos, como que de repente. E, se começou depois, tinha que cortar o direito. Isso apesar de todo o histórico de saúde do cidadão demonstrando tratamento psiquiátrico da infância até hoje. A justiça já mandou voltar a pagar.

Tem um casal com doença de chagas crônica: homem e mulher. O INSS cortou o benefício. Doença de chagas para o perito do INSS não é motivo de receber benefício (talvez por não ser nele). A justiça já mandou voltar a pagar.

São dois exemplos aqui. Nenhum deles da classe média ou alta. Há centenas, milhares outros. Basta dar uma lida nas decisões judiciais do dia-a-dia. Basta fazer uma visita ao Juizado Especial Federal.

Casos assim entopem a justiça brasileira. É desumano. Os relatos de idosos e doentes comovem. A ouvidoria do INSS não funciona. Se a verdade sobre o atendimento da Previdência brasileira fosse a relatada usualmente pela mídia nacional, juízes em todo Brasil não estariam se debruçando sobre processos que têm o INSS como réu, verdadeiro litigante contumaz. Perícias do INSS não estariam sendo revertidas às centenas todo mês pelo Judiciário brasileiro, após a revisão pericial de um especialista isento.

Mas, claro, para o governo brasileiro e para a mídia nacional tudo isso não passa de nada. Que venha a previdência privada, com seu lobby. Que o Estado brasileiro se torne ainda mais mínimo, abrindo mão de uma das poucas áreas sociais ainda existentes. Que o princípio da dignidade da pessoa humana, presente na Constituição Federal logo em seu artigo primeiro, seja pisoteado.

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