"Sim, eu quero saber. Saber para melhor sentir. Sentir para melhor saber." - Cézanne
Endereço: Avenida Rubens de Mendonça, 1856, sala 1402 - Edifício Office Tower, Bosque da Saúde, Cuiabá - MT, CEP 78050-040, Fone/Fax 065-3642-1718, e-mail advogadosabreu@gmail.com

segunda-feira, 18 de maio de 2015

Cobranças indevidas desgastam relação entre clientes e bancos

O Globo

A dívida já foi paga, mas o banco volta a cobrá-la dois anos depois. Embora o cliente tenha antecipado parcela do empréstimo consignado, o banco não informa à fonte pagadora e o valor é novamente descontado do salário. Quitou o valor total da fatura do cartão de crédito com alguns dias de atraso, e o banco cobrou por crédito rotativo, além dos juros. Esses são exemplos do principal problema no relacionamento entre clientes e bancos identificado pela Associação Brasileira de Defesa do Consumidor e Trabalhador (Abradecont): cobrança indevida. O levantamento, feito com exclusividade para o GLOBO, foi baseado nas reclamações que chegam à associação e em pesquisas nos tribunais e órgãos de justiça do país.

Reclamações sobre cobrança indevida por parte dos bancos também correspondem à parcela significativa das demandas que chegam ao Banco Central (BC), órgão regulador do sistema financeiro. Segundo levantamento do BC, de julho de 2014 a março de 2015, cobranças indevidas de tarifas somaram 6.421 reclamações. Praticamente a metade (2.953) são por serviço não contratado.

De acordo com a Abradecont, as cobranças indevidas mais frequentes estão relacionadas a seguros e serviços não contratados ou compras não realizadas, descontadas na conta corrente ou na fatura do cartão de crédito.

— Não há como afirmar a existência de má-fé nestes casos. Mas podemos dizer, categoricamente, que há sérios erros de logística nas instituições financeiras — afirma Carlos Eduardo Souza, advogado da Abradecont.

COMPROVANTES DE PAGAMENTOS

No Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (Sindec) do Ministério da Justiça —que reúne reclamações que chegam a mais de 600 Procons em todo o país —, a cobrança indevida foi o assunto mais reclamado do ano passado. Foram 884.052 queixas, relativas não só a bancos, mas empresas em geral. Na comparação por setor, bancos são o terceiro maior alvo das queixas, atrás apenas de telefonia fixa e móvel.

O advogado destaca que é comum dívida já paga ao banco no prazo correto ser cobrada posteriormente pela própria instituição financeira ou por empresas de cobrança. Por isso, aconselha o consumidor a guardar comprovantes de pagamentos por pelo menos cinco anos, digitalizados ou copiados.

O professor José Luiz de Souza Carvalho, morador do município de Miracema, no Noroeste do Estado do Rio, se viu de mãos atadas ao solicitar um cartão de crédito ao gerente de sua agência e ter o pedido negado devido a “uma pendência’’. O banco não confirma, mas ele acredita tratar-se de dívida que vem sendo cobrada de um outro cartão de crédito emitido em 2008, que ele não solicitou e sequer recebeu em casa. O débito atual é de R$ 3,6 mil, e a cobrança está sendo feita por uma empresa terceirizada, que ameaça colocar seu nome no Serasa, conta Carvalho:

— A cobrança diz que se eu pagar R$ 800 fico livre da dívida. Pedi à atendente que me enviasse o contrato do cartão, mas ela diz que não tem acesso. Solicitei, então, que mandassem minha reclamação ao banco.

O banco só entrou em contato com Carvalho depois que ele procurou a Defesa do Consumidor do GLOBO. Mas a questão não foi resolvida.

— O banco não me dá uma explicação clara, e já estou conversando com um advogado para ver como resolver — diz professor, que não descarta ir à Justiça.

Segundo a economista do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) Ione Amorim, o maior problema é que, ao pedir a revisão da cobrança indevida, o consumidor terá dificuldades de argumentar, porque dificilmente foi bem informado sobre o contrato ou recebeu todos os documentos que deveria:

— Todo o processo de crédito e renegociação de dívida deve ser documentado, para que o consumidor possa comprová-lo e tenha segurança jurídica em caso de questionamento.

PROVA DA DÍVIDA CABE AO COBRADOR

Qualquer divergência identificada na conta corrente, como lançamento de tarifas não contratadas, desconto de crédito não solicitado ou desconto de dívida já liquidada, deve ser informada pelo consumidor ao SAC do banco, que tem cinco dias, de acordo com lei federal, para dar resposta. Se não for satisfatória, deve procurar a Ouvidoria, o Banco Central ou um Procon. E, em último caso, a Justiça.

Se o consumidor perdeu o comprovante de uma dívida que está sendo questionada, é dever do banco provar a falta de pagamento, não o contrário. Principalmente se o comprovante foi emitido em papel termossensível, que é aquele utilizado nos terminais de autoatendimento e tem baixa durabilidade. Se a operação foi feita por meio da conta bancária, o banco deve rastrear o sistema para identificar o pagamento. Se a dívida foi terceirizada, a empresa responsável deve enviar os comprovantes ao banco.

O Banco Central, informou, por meio da assessoria, que questões relacionadas à legislação de proteção ao consumidor são tratadas pelos órgãos do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor. Quando recebe uma reclamação na qual constata indícios de violações ao Código de Defesa do Consumidor, o BC comunica a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon). A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) não comentou os casos específicos, mas orienta o consumidor a, primeiramente, manifestar a insatisfação ao gerente da própria agência. Em caso de negativa, deve entrar em contato com o SAC ou a Ouvidoria do banco.

Foi o que fez terapeuta Anna Vasconcellos ao ver em sua fatura de cartão uma cobrança de crédito rotativo que nunca fez:

— Paguei a fatura de abril com dois dias de atraso, mas quitei o valor total. Por isso questionei. Além da cobrança de três tipos de juros, fui obrigada a pagar por uma opção que não usei. Após ouvir do banco várias versões para explicar a cobrança, Anna procurou o GLOBO e o problema foi resolvido em pouco tempo:

— Achei absurdo pagar pelo que não utilizei.

PROBLEMAS E SOLUÇÕES

COMPROVANTE: Cliente pagou a dívida, perdeu os comprovantes e o banco está cobrando novamente.

O que fazer: Documentos originais devem ser guardados por cinco anos. Mas, se o consumidor não os tiver guardados, pode ingressar na Justiça, com base no Código de Defesa do Consumidor, e requerer a inversão do ônus da prova. Ou seja, o banco é quem terá de provar que o cliente não pagou o empréstimo.

VALOR ALTO: Renegociou uma dívida, não conseguiu quitá-la por completo, e o novo valor cobrado é muito superior ao débito em aberto.

O que fazer: Neste caso, a instituição financeira deve chamar o devedor para uma nova negociação, para extinguir a antiga dívida e dar lugar a uma nova. O que não é permitido é o banco fazer uma renegociação unilateral, sem consultar o consumidor. Neste caso, o cliente pode requerer judicialmente uma indenização.

DÉBITO INDEVIDO: Cliente de banco teve um débito não autorizado feito na conta corrente ou poupança.

O que fazer. Tanto o débito em conta-poupança quanto o em conta corrente só podem ser feitos com o consentimento do titular da conta. Do contrário, o consumidor poderá ingressar na Justiça para ser ressarcido e buscar compensação moral pelo dano sofrido.

DUPLA COBRANÇA: Conta de cartão de crédito já paga é cobrada novamente. Consumidor tem o comprovante. Cabe indenização?

O que fazer: Cada caso é um caso. Em princípio, a mera cobrança por uma dívida já paga não gera qualquer indenização. Mas se essa cobrança causar constrangimento, como ser cobrado no ambiente de trabalho ou ser negativado ou inscrito no SPC ou Serasa, cabe ação indenizatória.

PAGAMENTO FEITO: Cliente já pagou os empréstimos consignados, mas os descontos continuam vindo em seu contracheque.

O que fazer. O consumidor deve procurar resolver com a instituição financeira que concedeu o crédito. Se o banco não facilitar, deve entrar com ação judicial.

DESCONTO EM FOLHA: Trabalhador teve descontado, em seu contracheque, empréstimo consignado que não fez.

O que fazer. Deve procurar saber qual instituição está realizando o desconto e entrar em contato, anotando o nome dos atendentes e protocolo. Caso não resolva, deve comunicar à fonte pagadora, ou seja, ao órgão que emite a folha de pagamento e autoriza o desconto.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Comente este texto: